É de conhecimento geral que, com advento da lei 13.964/19, popularmente conhecida como pacote anticrime, promoveu alterações em nossa legislação, prevendo uma hipótese de lapso aplicável para os delitos hediondos e equiparados, vejamos o Art. 112, inciso VII, LEP:
VII- 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019).
A nova legislação, que revogou a lei anterior, não houve previsão legal quanto a reincidência não específica, e como houve revogação do antigo dispositivo, entendemos que a nova lei deve ser aplicada nos cálculos de pena dos sentenciados que devem ter retificado em relação à fração de pena a cumprir
Ocorre que, com a mudança legislativa, introduzida pela lei 13.964/19, que possui natureza mista (processual e penal) o percentual de 60% (sessenta por cento) e 70% (setenta por cento), ficaram destinados aos sentenciados reincidentes específicos em crimes hediondos, como decidido pelo Juízo da Vara de Execução Penal do Interior de Mato Grosso do Sul, Guia de Recolhimento nº 0001830-19.2009.8.12.0020, de 04/03/2021 – Dr. Luiz Felipe Medeiros Vieira, portanto, a lei deve ser interpretada como ”novatio legis in mellius”.
Ademais, nos casos em que os sentenciados possuem outras condenações em crimes comuns
(furto e roubo) e apenas 01 (um) crime hediondo ou equiparado, a lei mais benéfica deve ser aplicada ao
presente caso.
A esse respeito, a lei penal deve ser aplicada de forma retroativa
quanto mais benéfica ao sentenciado, conforme dispõe o Art. 5º,
inciso XL da nossa carta magna e parágrafo único do Art. 2º do Código Penal.
Importante destacar, que o Superior Tribunal de Justiça, vem entendendo reiteradamente que, por não existir porcentagem compatível, deve ser aplicado 40% (hediondo primário), impondo uma analogia “in bonan partem” (em favor do réu) que é a fração mais benéfica para o condenado.
Nesse sentido, recente entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus nº 616.267 de São Paulo:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS
CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. VIA INADEQUADA. LEI 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME).
PROGRESSÃO DE REGIME. PACIENTE CONDENADO POR TRÁFICO DE DROGAS. REINCIDÊNCIA EM
CRIME COMUM. HIPÓTESE NÃO ABARCADA PELA NOVATIO LEGIS. ANALOGIA IN BONAM
PARTEM. CUMPRIMENTO DE 40% DA PENA. ORIENTAÇÃO REVISTA. AGRAVO REGIMENTAL
PROVIDO. CONCESSÃO DE HC DE OFÍCIO. 1. O Supremo Tribunal Federal, por sua
Primeira Turma, e a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, diante da
utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua
admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via
recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício,
nos casos de flagrante ilegalidade. 2. Firmou-se, nesta Superior Corte, o
entendimento no sentido de ser irrelevante que a reincidência seja específica
em crime hediondo para a aplicação da fração de 3/5 na progressão de regime,
pois não deve haver distinção entre as condenações anteriores (se por crime
comum ou por delito hediondo). Interpretação da Lei 8.072/90. Precedentes. 3.
Com a entrada em vigor da Lei 13.964/19 – Pacote Anticrime –, foi revogado
expressamente o art. 2º, §2º, da Lei n. 8.072/90 (art. 19 da Lei n. 13.964/19),
passando a progressão de regime, na Lei de Crimes Hediondos, a ser regida pela
Lei n. 7.210/84. 4. A nova redação dada ao art. 112 da Lei de Execução Penal
modificou por completo a sistemática, introduzindo critérios e percentuais
distintos e específicos para cada grupo, a depender especialmente da natureza
do delito. 5. No caso, o paciente foi sentenciado pelo delito de tráfico de
drogas, tendo sido reconhecida sua reincidência devido à condenação definitiva
anterior pela prática de crime comum. Para tal hipótese, inexiste
na novatio legis percentual a disciplinar a progressão de regime ora
pretendida, pois os percentuais de 60% e 70% foram destinados aos reincidentes
específicos. 6. Em direito penal não é permitido o uso de interpretação
extensiva para prejudicar o réu, devendo a integração da norma se operar
mediante a analogia in bonam partem. (grifos nossos). 7.1 Agravo
regimental provido, concedendo habeas corpus de ofício, para que se opere a
transferência do paciente a regime menos rigoroso com a observância, quanto ao
requisito objetivo, do cumprimento de 40% da pena privativa de liberdade a que
condenado, salvo se cometida falta grave.
Consoante a este entendimento, a Quinta turma da mesma corte, em sessão do dia 09/12/2020, também uniformizou o entendimento, com a decisão favorável ao sentenciado, no HC 613.268, onde fixou o percentual de 40% em caso semelhante, devendo o percentual de 60% e 70% serem aplicados somente quando reincidente especifico em crime de natureza hedionda, não mais naqueles onde a reincidência se dá por crime comum.
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novatio legis in mellius: Trata-se de hipótese da
retroatividade da norma penal, disciplinada no art. 2º do Código Penal , in verbis:
"A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado"
Mauro Deli Veiga -OAB/MS 12.141
Hugo Edward Lima Martins - OAB/MS 23.130
Fones: 67 99296-5252; 67 99213-1560