quarta-feira, 19 de agosto de 2015

MONITORAMENTO DO PRESO E O FIM DO REGIME ABERTO




As dificuldades financeiras dos sistemas penitenciários do Brasil, aliada à falta de servidores, superlotação carcerária, péssimas condições das instalações prisionais –muitas vezes prédios adaptados- falta de convênios e criatividade das administrações em fazer funcionar uma unidade penal dependendo minimamente do estado, sem buscar maior participação das organizações não governamentais e sociedade civil,  são fatos motivadores de uma sentença em construção: FIM DO REGIME ABERTO DE CUMPRIMENTO DE PENA.

O monitoramento do sentenciado, através de sistema de tornozeleiras ou outro meio que venha se criar, é uma alternativa para os dirigentes estatais, embora o sistema não tenha ainda uma avaliação efetiva de real funcionamento e alcance dos objetivos que se busca. Em linhas gerais, falar de monitoramento de seres humanos, é algo muito complexo e um desafio da atualidade.

O monitoramento de presos tem sido objeto de estudos de respeitados penalistas e de legisladores do mundo todo. No Brasil duas normas consagraram o monitoramento eletrônico como uma viável alternativa ao encarceramento: as leis n° 12.258/2010 e nº 12.403/2011. Seria possível, no Brasil, substituir o cumprimento de pena tradicional pela vigilância eletrônica, criando uma prisão eletrônica em substituição da prisão física? E do ponto de vista da execução penal, seria eficiente e atenderia os fins que a lei de execução propõe? Na doutrina de Poza Cisneros (2002, p.60), a vigilância eletrônica consiste no método que permite “controlar donde se encuentra o el no alejamiento o aproximación respecto de un lugar determinado, de una persona o una cosa (...)”.

Os defensores da ideia sustentam que tal medida importa em economia, desoneração do estado de bancar alimentação, gastos com energia, água, esgoto, material higiênicos que são distribuídos aos custodiados, gastos com sistema de saúde, etc. além de desafogar as unidades penais que estão superlotadas e a dificuldade do preso em lidar com as mazelas da prisão e o receio de ser vitimado pelo contágio criminal e de doenças, e os riscos de ser obrigado a integrar ou fazer “missões” para organizações criminosas, o que provoca a evasão, e desmantelamento do regime aberto de cumprimento de pena. De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, a monitoração eletrônica pode ser manejada em duas hipóteses legais: a) como uma medida cautelar (Lei 12.403/2011); e como vigilância indireta do preso, nos casos de saídas temporárias durante o regime semiaberto e de concessão de prisão domiciliar (Lei 12.258/2010).

Em relação às condições do cumprimento de pena nos regimes abertos é notório que existe a superlotação, graves desrespeitos aos direitos humanos e pouco investimentos dos estados em construção de prédios apropriados, com estrutura capaz de oferecer ao custodiado uma oportunidade de aprender uma profissão enquanto cumpre sua pena. Àqueles que não precisam de ressocialização ou profissionalização, por serem presos ocasionais e sem histórico de vida voltada ao crime, o ambiente deve propiciar meios para que o sistema penitenciário tenha efeito menos repressores possíveis, sem esquecer o caráter punitivo da pena, para os quais, acreditamos que o monitoramento eletrônico pode ser viável, haja vista não tratar de presos habituais, sem histórico de vida voltada ao cometimento de crime, portanto, não precisam do rigor penitenciário, pois, não têm nada a se reeducar, mas apenas cumprir a pena que lhe foi imposta por ser autor de evento criminal isolado em sua vida. 

Embora não exista previsão legal para substituir o cumprimento de pena tradicional, do regime aberto, a participação das empresas interessadas em vender seus produtos, podem influenciar muito nas adequações legais, motivo pelo qual cabe aos gestores utilizar de meios já existentes para uma menor participação do Estado e maior participação da sociedade civil, igrejas e famílias dos custodiados, evitando o rigorismo do sistema penitenciário àqueles presos primários de fato (que não têm antecedentes criminais, inclusive antes dos 18 anos) ,com bons antecedentes e formação profissional. Iguais medidas também podem ser aplicadas em unidades de cumprimento de pena, onde a população carcerária é pequena, principalmente aquelas do interior dos Estados, onde normalmente são pessoas da própria comunidade e de baixa periculosidade, portanto, deve haver uma maior participação do Município na execução da pena, considerando que na maioria das vezes cometem crimes por falta de políticas públicas de educação e cuidado com crianças, jovens e desempregados.


Referência
Cadeia digital. Disponível em www.conjur.com.br.
CAPEZ, Fernando. Direito Penal Parte Geral. 6. ed. São Paulo: Paloma, 2000.
DIAS, Jorge de Figueiredo. Questões Fundamentais do Direito Penal Revisitadas. São Paulo: Ed. Revistas dos Tribunais, 1999.
DIP, Ricardo e MORAESJUNIOR, Volney Correa Leite de. Crime e Castigo. Reflexões Politicamente Incorretas. 2. ed. Campinas: Millennium, 2002.
Estados começam a usar tornozeleira eletrônica em preso. Disponível em: www.estadao.com.br/estadaodehoje.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 30. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

STF condena três perigosos ladrões: de 1 par de chinelos, de 15 bombons e de 2 sabonetes

STF condena três perigosos ladrões: de 1 par de chinelos, de 15 bombons e de 2 sabonetes

Publicado por Luiz Flávio Gomes - 4 horas atrás


O Brasil enfrenta efetivamente profundas crises (econômica, política, social, jurídica e, sobretudo, ética). Quando a Corte Máxima de um país é chamada para julgar três ladrões (um subtraiu 1 par de chinelos de R$ 16, outro 15 bombons de R$ 30 e o terceiro 2 sabonetes de R$ 48) e diz que é impossível não aplicar, nesses casos, a pena de prisão, ainda que substituindo-a por alternativas penais, é porque chegamos mesmo no fundo do poço em termos de desproporcionalidade e de racionalidade. Usa-se o canhão do direito penal para matar pequenos pássaros (Jescheck).
Em países completamente civilizados, para esse tipo de questão adota-se a chamada “resolução alternativa de conflitos” (RAC). O problema (enfrentado por equipes de psicólogos, assistentes sociais etc.) nem sequer vai ao Judiciário (desjudicialização). Do que é mínimo não deve se encarregar o juiz (já diziam os romanos, há mais de 2 mil anos). O fato não deixa de ser ilícito, mas a cultura evoluída se contenta com esse tipo de solução (que faz parte de um contexto educacional de qualidade). É exatamente isso o que acontece nas faixas ricas no Brasil. Muitos filhos de gente rica, nos seus respectivos clubes ou nas escolas, praticam subtrações de pequenas coisas. Tudo é resolvido caseiramente (sem se chamar a polícia). A vítima pobre não tem a quem chamar, salvo o 190. Daí a policialização e judicialização de todos os conflitos, incluindo os insignificantes. Coisa de paiseco atrasado, de republiqueta (marcadamente feudalista).
 
Vivemos a era da emocionalidade (J. L. Tizón, Psicopatologiía del poder). No campo penal, por força da oclocracia (governo influenciado pelas massas rebeladas), dissemina-se (com a intensa ajuda da mídia) o populismo penal irracional centrado no uso e no abuso da prisão desnecessária. A explosão do sistema penitenciário é uma tragédia há tempos anunciada. Agrava-se a cada dia (somente em SP, o saldo dos que entram e dos que saem chega a 800 novos presos por mês).
A pena de prisão para fatos insignificantes conflita com o bom senso (com a racionalidade). Os países desenvolvidos aplicam outros tipos de sanção. Em sistemas acentuadamente neofeudalistas como o nosso, tenta-se disseminar o chamado princípio da insignificância, que elimina o crime (evitando a condenação penal). Mas o legislador brasileiro nunca cuidou desse assunto (salvo no Código Penal militar). Cada caso então fica por conta de cada juiz. O STF tratou do tema em 2004, no HC 84.412-SP. Aí fixou vários critérios, mas todos “abertos” (sujeitos a juízos de valor de cada juiz). Uma “jabuticabada” (como diz Rômulo de Andrade Moreira).

O Plenário do STF voltou a enfrentar o tema em 3/8/15 (nos HCs 123734, 123533 e 123108): réu reincidente pode ser beneficiado com o princípio da insignificância? Se o furto é qualificado, pode incidir o citado princípio? O STF fixou algumas orientações (não vinculantes aos juízes do país). Os três casos julgados, somados, davam R$ 94. Pobre que furta é ladrão, rico que rouba é barão.
O min. Luís Roberto Barroso, no princípio, votava pela incidência do princípio da insignificância. Mudou de posicionamento a partir do voto-vista do ministro Teori Zavascki, que firmou orientação no sentido oposto (de não aplicar referido princípio nesses casos). O Pleno apenas sinalizou o caminho a ser seguido. Não fixou entendimento vinculante. Porque, em direito penal, cada caso é um caso.

Para o ministro Zavascki a não aplicação do princípio da insignificância (nos casos citados) se deve ao seguinte: (a) são crimes com circunstâncias agravadoras; (b) apenas a reparação civil é insuficiente (para a prevenção geral); (c) reconhecer a licitude desses fatos é um risco (risco do justiçamento com as próprias mãos); (d) a imunidade estatal pode se converter em justiça privada (com consequências graves); (e) cabe ao juiz em cada caso concreto reconhecer ou não a insignificância assim como fazer a individualização da pena.

Nos três casos concretos analisados não houve reconhecimento do princípio da insignificância, mas, tampouco se admitiu o encarceramento do agente. A saída para evitar a prisão é a aplicação de penas substitutivas (CP, art. 43 e ss.) ou a aplicação do regime aberto (que hoje, na quase totalidade das comarcas, é cumprido em domicílio, em razão da ausência de estabelecimentos penais adequados). Mesmo em se tratando de reincidente, nos casos de pouca repercussão social, pode-se aplicar o regime aberto (para evitar a prisão). Qualquer outro regime seria (mais ainda) desproporcional. País que não cuida da prevenção (e que conta com escolaridade média ridícula de apenas 7,2 anos, exatamente a mesma de Zimbábue) tem que se expor internacionalmente ao ridículo. Chega na sua Corte Máxima o furto de bombons, de um par de chinelos, dois sabonetes, um desodorante, duas galinhas etc. O País e os juízes que julgam penalmente coisas pequenas jamais serão grandes.
Saiba mais
Do livro de Rogério Sanches (Direito penal-PG) extraímos, resumimos e atualizamos o seguinte quadro sobre o panorama jurisprudencial do princípio da insignificância (p. 74): Veja a tabela aqui.
 http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/216436768/stf-condena-tres-perigosos-ladroes-de-1-par-de-chinelos-de-15-bombons-e-de-2-sabonetes?utm_campaign=newsletter-daily_20150805_1641&utm_medium=email&utm_

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