segunda-feira, 18 de junho de 2012

A PRISÃO CAUTELAR NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA PODE GERAR INDENIZAÇÃO?



A prisão preventiva do acusado de violência doméstica é uma alternativa trazida pela Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, para resguardar a integridade física da vitima. Contudo, fato curioso tem ocorrido no cumprimento da pena dos sentenciados nestes crimes, pois, muitas vezes, o réu responde o processo preso preventivamente, em regime fechado, e quando é sentenciado o regime inicial do cumprimento da pena é em regime mais brando, como aberto ou semiaberto.

“O artigo 42 deste novel Diploma protetivo da mulher insculpiu despercebidamente no Código de Processo Penal, na parte que trata da prisão preventiva, um novo inciso ao seu até então sonolento artigo 313, que cuida dos casos em que admitida à decretação desta modalidade de segregação provisória do acusado.
Reza agora mencionado artigo 313, em seu inciso IV, que para resguardar a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal, ou mesmo para assegurar a aplicação da lei penal, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
De uma leitura atenta deste inovador inciso percebe-se com firmeza que em tema de violência doméstica e familiar contra a mulher à prisão preventiva do acusado passa à categoria de cautela subsidiária, ultima ratio mesmo, deixando de ser medida processual imediata, ou mesmo alternativa única, a ser decretada pelo juiz para garantia daqueles valores tutelados pelo artigo 312 do CPP.”, afirma o Defensor Publico do Estado do Espirito Santo, Dr. Carlos Eduardo do Amaral em http://www.conjur.com.br/2008-nov-24/prisao_preventiva_ultima_medida_violencia_domestica.
O Estado tem o dever de indenizar o réu quando cumpre pena além daquela prevista na sentença condenatória. Nos casos de prisão preventiva, que é cumprida em regime fechado, e a condenação se dá em regime mais brando, será o caso de indenização pelo cumprimento da pena em regime mais rigoroso?
Muitas vezes o acusado é preso preventivamente, para garantir a segurança da vitima, e quando é sentenciado, depois de três ou quatro meses, a condenação é em regime aberto e o mesmo já cumpriu toda a reprimenda em regime mais severo da condenação, sendo, então, expedido alvará de soltura, colocando, finalmente, o sentenciado em liberdade.
Ora, se o acusado cumpriu pena em regime mais severo que o da condenação, é óbvio que existe aí um constrangimento ilegal, portanto, passível de indenização, como ocorre em casos simétricos, cujo dever de indenizar ou compensar a falha estatal se mostra nitidamente,vejamos:

A propósito, leciona JÚLIO FABBRINI MIRABETE:

"A prisão albergue domiciliar só é cabível nas hipóteses do art. 117 da Lei de Execução Penal. Entretanto, quando o Estado não está aparelhado para oferecer estabelecimento prisional adequado, de sorte que se possa observar, rigidamente, a progressão legalmente determinada, o direito do condenado que faz jus ao regime aberto não pode ser obstado por essa omissão. Assim, vários tribunais, com exceção do STF, têm decidido pacificamente que o condenado que fizer jus ao regime aberto tem direito a prisão domiciliar quando inexistir casa do albergado onde possa cumprir a pena no regime aberto" (in, Execução Penal, 9ª ed., São Paulo, Ed. Atlas, 2000, páginas 381/382) (sublinhei).
Outro não é o entendimento emanado do colendo Superior Tribunal de Justiça:
"CRIMINAL. HC. EXECUÇÃO. DESVIO. CONDENAÇÃO EM REGIME SEMI-ABERTO. CUSTÓDIA EM REGIME FECHADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.
- Reconhece-se a ocorrência de constrangimento ilegal, se demonstrado que a paciente, condenada a regime prisional semiaberto, encontra-se recolhida em regime fechado.
- Não se pode exceder aos limites impostos ao cumprimento da condenação, sob pena de desvio da finalidade da pretensão executória. Precedentes.
- Ordem concedida para determinar que a paciente cumpra, imediatamente, a pena no regime certo, ou, não sendo isto possível, para permitir que aguarde a abertura de vaga no regime semiaberto em regime aberto, a ser cumprido em Casa de Albergado ou em regime domiciliar, se inexistente Casa de Albergado local". (STJ, HC 21441/PR, 5ª T., Rel. Min. Gilson Gipp, j. 06/08/02, DJ de 16/09/02, p. 214) (destaquei).
"PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. INOBSERVÂNCIA DO REGIME PRISIONAL DA SENTENÇA. REGIME MAIS SEVERO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
- Condenado o réu a cumprir pena em regime prisional semiaberto, não pode o mesmo permanecer cumprindo pena em regime fechado, enquanto espera vaga no estabelecimento adequado, resultando em constrangimento ilegal.
- Recurso ordinário provido". (STJ, RHC 12133/SP, 6ª T., Rel. Min. Vicente Leal, j. 06/08/02, DJ de 26/08/02, p. 315) (destaquei).
Ainda:
"EXECUÇÃO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. REGIME ABERTO. RÉU MANTIDO EM SITUAÇÃO MAIS GRAVOSA. HABEAS CORPUS. PRISÃO ALBERGUE DOMICILIAR. O Estado não pode submeter o condenado a regime mais rigoroso que o estabelecido na condenação, ainda que por pouco tempo e no aguardo de problema administrativo, sendo o caso de concessão de prisão domiciliar ante a falta de estabelecimento adequado a cumprimento em regime aberto. (Precedentes). Recurso provido." (RHC nº 13564/MG - Rel. Min. Félix Fischer) (destaquei).

HABEAS CORPUS. FURTO. QUADRILHA. PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃOQUANDO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. REGIME ABERTO. APELAÇÃO PENDENTE DEJULGAMENTO.1. Deve-se evitar que o réu aguarde o trânsito em julgado da condenação em situação mais gravosa do que aquela estabelecida para o cumprimento da pena definitiva (in casu, regime aberto).2. Ordem concedida para garantir aos pacientes o direito de aguardarem liberdade o trânsito em julgado da condenação, salvo prisão por outro motivo.
(216429 RS 2011/0197813-4, Relator: MIN. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 23/02/2012, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/03/2012)

Então, se, na  sentença  condenatória, foi fixado o regime  semiaberto ou aberto como o inicial de cumprimento da pena, deverá, em princípio, o réu aguardar o julgamento do recurso de apelação em liberdade, se por outro motivo não estiver preso, precedentes do STJ.

Nos casos de prisão preventiva, decretada para salvaguardar a vitima de violência doméstica, esta não pode perdurar até a sentença ,principalmente, quando pelas características do réu, sendo primário, bons antecedentes, ocupação lícita, residência fixa, conduta social normal, crime sem grande potencial ofensivo, a condenação se dará em regime mais brando, em atenção aos institutos da dosimetria e individualização da pena.

Pela lógica sistemática, o réu que trazer consigo estas características, e verificado o máximo da pena, irá iniciar o seu cumprimento em regime aberto ou semiaberto. Então, a prisão cautelar, será uma afronta aos princípios reais de sua própria existência. Ela terá causado um constrangimento ilegal, que deverá ser ressarcido pelo Estado. Ademais, manter uma pessoa presa em regime penitenciário fechado, quando poderia ser aplicada outra medida, jogando esse réu junto com presos com histórico de vida voltado para o crime, é fomentar a superlotação carcerária, sem falar que esse tipo de preso pode ser arregimentado ou coagido por outros já aprisionados, integrantes de facções criminosas, para servirem ao crime quando em liberdade, o que é um grande risco para a coletividade.


terça-feira, 5 de junho de 2012

Cidadania no Cumprimento da Pena. É possível?


Contexto do problema





O centro de Santa Luzia foi o primeiro a ter projeto de arquitetura desenvolvido de acordo com princípios da Apac



A primeira experiência marcante de participação da comunidade local nos assuntos administrativos de uma unidade prisional deu-se nos anos de 1970-80, no município de São José dos Campos, estado de São Paulo, iniciada por um grupo católico que se constituiu na primeira APAC, a Associação de Proteção e Assistência Carcerária de São José dos Campos.

No início dos anos de 1990, inspirado nesta primeira iniciativa, o Juiz Corregedor dos presídios da comarca de Bragança Paulista, Dr. Nagashi Furokawa, liderou a comunidade local no esforço de replicar a experiência. Foi fundada a APAC local que passou a fiscalizar as atividades da cadeia pública da cidade e a prestar diversos serviços de assistência carcerária.

O expressivo envolvimento da comunidade assegurou o sucesso da experiência, chamando a atenção do Governo do Estado que aceitou a proposta da APAC de um convênio com a Secretaria de Segurança Pública (SSP) nos seguintes termos: o Estado repassaria à APAC o valor dos gastos locais com a alimentação dos presos, a APAC proveria a alimentação e com os recursos que eventualmente sobrassem ampliaria a assistência aos presos.

O repasse que à época era de R$ 10,00 dia/preso e a APAC conseguiu prover melhor alimentação ao custo de R$ 2,50 dia/preso. Com o restante pôde contratar advogado, médico, psicólogo e assistente social, entre outros profissionais, para atender aos presos. Passado um ano, e apenas com a verba do convênio, teve inicio a construção de um anexo para abrigar mais 120 presos. Pouco depois a própria APAC propôs a redução do valor do repasse para R$ 7,00 dia/preso, sem prejuízo para o padrão de atendimento alcançado: a motivação para a proposta foi a de provar ao Governo do Estado que o valor anterior era exorbitante e que este estava gastando muito mal em todo o sistema.

Em dezembro de 1999, Nagashi Furokawa assumiu a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo (SAP) e transferiu para esta pasta a experiência de Bragança Paulista, piloto para a criação do programa em nível estadual. O programa começou oficialmente em 29 de dezembro de 2000.

Desde os anos 1980, a crise fiscal do Estado brasileiro repercutiu fortemente sobre o sistema penitenciário. O baixo nível de investimento para a melhoria e ampliação dos presídios, a ausência de políticas consistentes de contratação, treinamento e de plano de carreira para funcionários contrastam com o aumento generalizado da tensão social e da violência por ela produzida.
Há um profundo déficit entre a oferta de novas vagas no sistema prisional e a demanda trazida pelo poder Judiciário. Como resultado, observa-se, de forma generalizada, os casos de superlotação, maus tratos, abuso de autoridade, torturas, assassinatos, mutilações, fugas e rebeliões. Fatos que geram freqüentes denúncias que deixam o Brasil em posição delicada na área da Cidadania e dos Direitos Humanos.

Na última década, o Governo do Estado de São Paulo iniciou ações para reverter este quadro. Em 2005, o Estado detinha 137.282 presos, 42% da população carcerária do país e apresentava uma taxa média de crescimento da população carcerária de 2% ao ano, o que faz o déficit estimado de vagas situar-se em torno de 27.000. O índice de presos por 100.000 habitantes é de 278 enquanto que no Brasil este índice é de 142. O governo do Estado tem sistematicamente ampliado

As experiências de terceirização para a exploração de mão de obra barata por empresas é uma prática comum no mundo e está sendo experimentada no Brasil. Entretanto, estudos e observações apontam que tais experiências em nada contribuem para a ressocialização do preso e muito pouco para baixar os custos operacionais dos presídios.

O programa Cidadania no Cárcere acredita na efetividade da ressocialização dos presos por meio da transformação da realidade carcerária embasada na integração das ações do Estado, da sociedade, da iniciativa privada e fundamentalmente dos familiares do preso.

O primeiro objetivo do programa consiste em oferecer um meio alternativo para o cumprimento de pena em estrutura física, administrativa e social diferenciada que assegure maior probabilidade de recuperação. A busca da humanização no cumprimento da pena vem do reconhecimento de que não é possível conseguir a regeneração do homem encarcerado sem o atendimento mínimo de seus direitos naturais.

Prover estes direitos significa reproduzir na unidade prisional ambiente harmônico que favoreça a reinserção dos apenados dando-lhes condições de manterem ambiente limpo e agradável do ponto de vista da higiene, livre das tensões excessivas do encarceramento e sobretudo produtivo para que possam aprimorar seus conhecimentos, habilidades e adquirir condições de competição no mercado de trabalho para a volta à liberdade.

Para disponibilizar este ambiente é imprescindível conscientizar a sociedade sobre a necessidade de uma execução penal eficaz, no sentido de assegurar que não haverá fugas e que o preso cumprirá a pena.

O segundo objetivo é o de aumentar o número de vagas do sistema prisional num modelo administrativo que assegure maior eficiência do gasto público.

Em Campo Grande, Estado de Mato Grosso do Sul, existe uma instituição que deseja implantar esse modelo de executar pena, primeiramente começando por sentenciados de pena alternativa e num segundo momento apenados dos regimes aberto e semiaberto, principalmente aqueles que estão em liberdade e que deverão ser apresentar em um desses regimes para cumprimento de sua pena, evitando que aquele indivíduo que nunca foi preso tenha o contato com aqueles que já têm um histórico de vida voltado para o crime, desta forma, evitando a prisonização e os riscos de que este indivíduo venha a ser aliciado por integrantes de facções criminosas, servindo ao crime.


Fonte: Cartilha do Estado de São Paulo: Humanizando a Política Carcerária.  Cidadania no Cárcere.

sábado, 2 de junho de 2012

POR QUESTÃO FINANCEIRA RÉU NÃO DEVE PERMANECER PRESO


Arbitrada fiança para concessão da liberdade provisória e não sendo recolhida por falta de condições financeiras do acusado, é direito do réu ser colocado em liberdade independente de seu pagamento, sob pena de afronta ao principio constitucional da isonomia, pois, permanecendo preso em virtude de não ter dinheiro para recolher a fiança arbitrada, importa dizer que está preso apenas por  questão financeira, o que não é razoável em um estado democrático de direito.

No presente caso, abaixo descrito, o réu foi preso por ao ser perseguido por policiais, foi encontrado em sua residência em posse de arma de fogo e substância tóxica.

Na Delegacia, ao confeccionar o auto de prisão em flagrante, a autoridade policial não sustentou quais os motivos que levaram a convencer que se tratava de traficante, pois, o mesmo poderia ter aquela droga para consumo pessoal, assim sendo, não deveria ser preso por esse motivo, pois, não é prevista pena de prisão para usuário, o que motivou o juiz a relaxar a prisão e arbitrar fiança, como uma medida cautelar para soltura do réu. Vejamos:

Autos n.° 0020437-35.2012.8.12.0001
Ação: Auto de Prisão Em Flagrante
Parte Ativa: Ministério Público Estadual
Parte Passiva: V. G.D.
Vistos...
I. Primeiramente, mantenho, por seus próprios fundamentos, a decisão de fls. 30/33, no que diz respeito ao relaxamento da prisãoem flagrante do autuado.
Com efeito, conforme alinhado na decisão acima citada,não houve a necessária escrição da conduta referente ao tipo penal da autuação –tráfico de drogas – o que, como sabido e ressabido, é exigência constitucional. Bem verdade que houve a oferta de denúncia pela mesma acusação, peça inaugural recebida por este juízo. Contudo, o que se tem, na verdade, é prova de materialidade (apreensão de entorpecente) e indícios de autoria acerca da propriedade/posse/detenção da droga, o que justifica a instauração da persecução penal judicial à vista dos fatos narrados, que pode caracterizar, ainda mais por conta das especificidades do caso, conforme regular instrução, os crimes de tráfico ou de mera posse para uso pessoal.
Nunca é demais lembrar, por fim, que a tipificação legal lançada pelo órgão acusador não vincula o juiz.
Desta feita, sem mais delongas e considerando a decisão de fls. 30/33, indefiro o retro pretendido pelo parquet.

II. No mais, recepciono o intento de fls. 40/43 como pedido de redução/dispensa da fiança, cujo objeto merece guarida.
Com efeito, verifica-se de fato que o requerente não possui condições financeiras de arcar com a fiança arbitrada, em especial pela sua capacidade econômica declarada.
Ademais, está preso já há algum tempo (mais de mês) e ainda não recolheu a fiança, a qual possui valor módico (R$ 622,00), o que denota, de fato, aliado à circunstância de estar assistido pela Defensoria Pública, não possuir condições financeiras de suportá-la.
Sua mantença, assim, acabaria, por via oblíqua, de impedir sua liberdade tão somente por questões financeiras, o que não pode ser aceito, sob pena de flagrante violação do princípio constitucional da isonomia.
Portanto, outra solução não há senão a dispensa da fiança, na forma do art. 350 do Processo Penal.

Posto isto, DISPENSO o requerente do pagamento do valor da fiança arbitrada, ficando sujeito, porém, às disposições do art. 327 e 328 do Código de Processo Penal.
Expeça-se, pois, alvará de soltura e cientifique-o das observações dos artigos supra citados.
Ciência ao MP.
Oportunamente, arquivem-se mediante cautelas de estilo, transladando cópia para a ação principal.
Intimem-se. Cumpra-se.
Campo Grande, 01 de junho de 2012.
Juliano Rodrigues Valentim
Juiz de Direito
(assinado digitalmente)

Postagem em destaque

Quando deve ser cumprido um alvará de soltura?

  ALVARÁ DE SOLTURA   Alvará de Soltura é o instrumento processual utilizado pelo juiz de direito para colocar a pessoa presa em liberdad...